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17 nov

Artigo – Os caminhos e os desafios para erradicar o analfabetismo no Brasil

Por Carolina Paschoal, diretora e pedagoga da Escola Pedro Apóstolo 

 

Em diferentes cidades do país, se este artigo for entregue a uma pessoa, ela poderá não conseguir decifrar o que significam essas letras e palavras. Isso ocorre porque quase 10 milhões de pessoas com 15 anos ou mais não sabem ler e escrever. O número representa 5,6% da população total do Brasil, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE). Ainda que a porcentagem seja baixa em relação ao que foi registrado no início da República (em 1889 eram 85% de analfabetos, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada – IPEA), o número de pessoas que não sabe ler e escrever revela um retrato de desigualdade social, regional e racial que o país ainda carrega.

Neste dia 14 de novembro, quando é celebrado o Dia Nacional da Alfabetização, para explicar melhor os desafios que o Brasil enfrenta, é importante ver o que esses 5,6% da população quer dizer. Dentro desse universo, 55,3% vivem no Nordeste, o que já nos mostra um abismo geográfico. Quando o assunto é cor e raça, 3,4% da população branca ainda não sabe ler e escrever, enquanto entre as pessoas negras o número é de 7,4%. Ou seja, a questão racial está escancarada também no ato de ler e escrever. Outro dado preocupante é que 18% dos jovens de 14 a 29 anos não completaram a educação básica (Ensino Fundamental e Médio), seja por abandono ou por nunca terem frequentado as escolas.

É notório que um número que parecia pequeno, na verdade, esconde muitos mais. E mesmo para aqueles que são letrados, muitas vezes a interpretação de um texto não é completa: são considerados analfabetos funcionais, o que mostra mais um obstáculo na alfabetização. Segundo o Relatório do 2º Ciclo de Metas do Plano Nacional de Educação (PNE), divulgado em 2018 (o mais recente), a taxa de analfabetismo funcional é de 16,6% em pessoas com 15 anos ou mais, o que, segundo o documento, está distante dos 9,2% projetados para o ano de 2024, que está prestes a se iniciar. Quando analisamos as regiões Norte e Nordeste, esse índice sobe para 20,2% e 25,9%, respectivamente.

Mas como a educação pode superar esses desafios? Qual o segredo para que possamos diminuir ainda mais esses número, possibilitar a tantas pessoas a alfabetização plena? A resposta não é simples, mas existem vários caminhos que devem ser trilhados. Um deles é a valorização dos profissionais da educação. São eles que se empenham, todos os dias, muitas vezes com falta de recursos, para ver seus alunos e alunas progredirem nos estudos. Eles são a engrenagem e a força intelectual que move a educação brasileira. Seu trabalho não deve ser somente louvado, mas, acima de tudo, bem estruturado, seja em questões físicas, salariais e emocionais. Não se faz educação sem professores, pedagogos, funcionários, merendeiras e toda a estrutura de uma escola. E isso fica claro também para os alunos, que são capazes de perceber a desvalorização da educação e dos profissionais, pois fazem parte de sua rotina diária de aulas.

Por que é necessário lembrar desta questão óbvia? Uma pesquisa divulgada em setembro de 2022 pelo Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp) revelou que até 2040 o Brasil terá déficit de 235 mil professores na educação básica. Entre as causas dessa falta de docentes está o desinteresse dos jovens, motivado não só por questões salariais, mas por falta de estrutura, violência e problemas de saúde. Portanto, se queremos avançar na erradicação do analfabetismo em suas diferentes formas, é essencial a valorização e respeito aos profissionais por toda a sociedade.

Outra questão que podemos levantar é a busca ativa de pessoas que estão à margem da educação, seja por falta de acesso, desinteresse ou pela evasão escolar. Percebe-se a necessidade de olhar para esse público e entender as razões que levar para que muitas pessoas permaneçam na condição de analfabetismo mesmo com tantas possibilidades de acesso à informação e educação. Talvez seja uma questão de insistirmos enquanto sociedade para que essa parcela população inicie seus estudos ou os retome de onde parou. Talvez seja um fator ainda mais profundo: o de enfrentarmos preconceitos e barreiras sociais latentes no Brasil e que impediram que essas pessoas entrassem na educação quando ainda eram jovens.

É um trabalho difícil, pois as nuances que cercam essa população podem ser diversas. Mas é necessário que elas entendam que a alfabetização é uma conquista também individual, e não só de números divulgados em pesquisas. Trata-se de mostrar que isso possibilita independência e autoestima, ainda mais em uma sociedade cada vez mais tecnológica. Porém, esse processo de compreensão é obrigação de diferentes membros da sociedade, desde a família até mesmo organizações de bairro, grupos comunitários, igrejas, as próprias instituições de ensino e os atores governamentais. Buscar essa população ativamente, e a todo momento, é dever do brasileiro que quer ter uma sociedade mais plena e independente com acesso à informação e conhecimento.

 

Artigo publicado com exclusividade na Gazeta do Povo